A democracia hoje é um princípio constitucional. De acordo com a Constituição Federal de 1988 vivemos em um Estado Democrático de Direito. Contudo, após 30 anos de um processo intenso de redemocratização, muitos desafios e obstáculos ainda precisam ser superados para que possamos dizer que de fato vivemos em uma democracia no sentido pleno da palavra.
É claro que a democracia, tal como a conhecemos, tem suas falhas. Apesar disso, acompanhamos atônitos os mais recentes ataques ao Estado Democrático de Direito por grupos ideológicos que de forma insensata, para dizer o mínimo, defendem o retorno do regime militar (me refiro aos atos golpistas do dia 08 de janeiro). Sob os gritos de uma massa enlouquecida, um exemplar da Constituição era rasgado na praça dos três poderes (símbolo da nossa democracia). Diante de tal cenário uma atitude se torna imperiosa: a defesa da democracia.
A democracia tem suas falhas, como já frisamos. O modelo de democracia representativa característico do Estado brasileiro parece atender muito mais aos interesses de grupos políticos que se alternam periodicamente no poder do que os interesses da própria sociedade. Nossa democracia, de pouco mais de 30 anos, ainda não está devidamente amadurecida. Mas isso não significa que devemos abandonar o modelo democrático de governo.
Há um intenso debate por parte de intelectuais, cientistas políticos, filósofos, sobre os limites da democracia representativa. Um dos principais motivos de insatisfação com esse modelo são as articulações por parte de grupos políticos com o claro objetivo de se manter no poder, algumas vezes sem o menor escrúpulo, acompanhado de inúmeros escândalos de corrupção envolvendo a quase totalidade dos partidos políticos. Apesar disso, a saída não estaria na volta a um regime militar, como querem determinados grupos ideológicos. A saída está na própria democracia. Na defesa de uma democracia com efetiva participação do povo, um modelo de democracia participativa e/ou deliberativa que aposta na capacidade da sociedade civil atuar junto ao poder público contribuindo para sua democratização. É preciso democratizar a democracia, para usar o título de uma das obras do sociólogo português Boaventura de Sousa Santos.
A democracia perde sua força quanto mais debilitada for a participação social da população dentro da esfera pública política. Para que a democracia se torne de fato uma forma de organização política popular é preciso que haja uma maior participação da sociedade nas esferas de poder, seja no âmbito do poder executivo ou do poder legislativo. Dentre as inúmeras possibilidades gostaria de ressaltar o papel dos Conselhos Gestores de Políticas Públicas como um espaço de participação social.
No que diz respeito aos Conselhos de Políticas Públicas, foi a própria Constituição Federal de 1988 que trouxe inovações significativas no campo da democracia, ao garantir a possibilidade de participação popular na formulação, gestão e controle das políticas públicas, como nos casos das políticas de saúde, assistência social, desenvolvimento urbano e proteção ambiental, para citar alguns exemplos.
A Constituição garantiu uma base jurídica ao Estado de Direito para a construção de um novo formato de cidadania que não se limita mais ao modelo representativo de delegação de poderes, criando espaço para se pensar uma democracia mais participativa. E os Conselhos de Políticas Públicas, de educação, saúde, cultura, meio ambiente e tantos outros, se caracterizam pela possibilidade de participação do cidadão ou cidadã no âmbito das políticas públicas, mesmo não pertencendo a nenhum partido político
Tanto no âmbito federal quanto estadual e municipal existe um Conselho correspondente responsável por cada área de políticas públicas, seja o Conselho Nacional de Saúde, Conselhos Estaduais de Educação, Conselhos Municipais de Saúde e assim sucessivamente. Atualmente, a maior parte dos programas do governo federal prevê a participação dos cidadãos na execução e no controle das políticas públicas por meio de tais Conselhos. Até mesmo a liberação de recursos a Estados e municípios, em alguns casos, está vinculada à instituição dos Conselhos, que devem contar com condições necessárias para o seu funcionamento, a exemplo do Programa Nacional de Alimentação Escolar-PNAE, Programa Saúde da Família-PSF, Fundo de Educação Básica – Fundeb, e muitos outros.
Os Conselhos de Políticas Públicas são canais de participação legalmente constituído para o exercício do controle social das políticas públicas. Constituem canais de participação que articulam representantes da população e membros do poder público estatal em práticas que dizem respeito à gestão de bens públicos. Talvez com uma certa dose de otimismo possamos pensar nestes Conselhos como uma forma de reinventar a democracia para que ela seja parte da solução dos problemas sociais. Um modelo de democracia que possa, de fato, representar os interesses da sociedade ao invés de reforçar a manutenção do sistema de desigualdade e exclusão que são, de certa forma, naturalizadas pelo atual Estado democrático.
Alexsandro Melo Medeiros é Professor no curso de Pedagogia na Universidade Federal do Amazonas – Campus Parintins. Possui graduação (licenciatura e bacharelado) em Filosofia pela Universidade Federal de Pernambuco. É mestre em Filosofia pela Universidade Federal de Pernambuco. Doutor em Sociedade e Cultura na Amazônia pela Universidade Federal do Amazonas. Administrador do website Sabedoria Política e do canal do YouTube Sabedoria Política.
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