Paulo Corrêa: Conheça a história do bairro mais populoso de Parintins

Resultado da invasão a Fazenda Itaúna, na década 1990, do senhor Paulo Corrêa, o bairro hoje concentra o maior número populacional de Parintins

18/05/2023 às 18h49 Atualizada em 12/09/2023 às 12h08
Por: Vinícius Bellchior
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Bairro Paulo Corrêa atualmente - Foto: Jornalismo Parintins
Bairro Paulo Corrêa atualmente - Foto: Jornalismo Parintins

Memória é identidade, é com esta premissa que o JORNALISMO PARINTINS, liderado pelos jornalistas Vinícius Bellchior e Ana Cristina Machado, aceita o desafio de contar a história dos bairros de Parintins, por número populacional, dada a escassa bibliografia referente ao assunto. Parintins, conhecida internacionalmente pelo seu Festival Folclórico, protagonizado pelos Bois-Bumbás Caprichoso e Garantido, e sendo o segundo município mais populoso do Amazonas, atrás apenas da capital Manaus, torna-se importante a documentação da sua história em todos os seus aspectos, seja dos bairros ou da sua própria fundação.

Para esta reportagem, iremos usar como fonte a pesquisa intitulada “História e Memória: Da invasão ao processo de criação do bairro de Paulo Corrêa, em Parintins”, do professor Gilciandro Prestes de Andrade, única que encontramos referente ao assunto.

O bairro Paulo Corrêa atualmente       

De acordo com dados do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), de 2010, o bairro Paulo Corrêa lidera o ranking populacional no município, com cerca de 13.666 habitantes, resultado de uma ocupação urbana na década de 1990. Cabe lembrar que os bairros mais populosos de Parintins são resultados de ocupações urbanas, como o Itaúna II e Palmares.

Um trecho do bairro Paulo Corrêa - Foto: Jornalismo Parintins

O que muita gente desconhece, é quem foi Paulo Corrêa e como o bairro surgiu, registro histórico que será transcrito a partir de agora. Paulo Corrêa era o proprietário da fazenda invadida, o que mais tarde viria tornar-se um bairro com o mesmo nome, um processo conturbado que envolveu reintegração de posse pela Justiça, dando assim, ganho de causa ao dono do local.

Os moradores

Para Lorena Fonseca, moradora do bairro há 4 anos, afirma que o que mais chama a atenção no bairro é a tranquilidade. “É um bairro que não é movimentado e não tem muito barulho de carros e motos. Antes eu morava na Avenida Paraíba, acordava e ia dormir com o barulho do movimento da rua, era bem estressante”, afirma. Magno Augusto, morador do bairro há 21 anos, diz que o que revela a identidade do bairro é a sua calmaria. “Eu e minha família nos mudamos para o Paulo Correa no ano de 2000, nesses anos o bairro passou por muitas mudanças, principalmente relacionadas a infraestrutura”, explica.

Trecho do bairro Paulo Corrêa - Foto: Jornalismo Parintins

Apesar dos avanços, Magno pontua algumas situações que ainda precisam melhorar, como na área da educação e saúde. “Alunos daqui precisam estudar em escolas de outras áreas da cidade, aqui só temos a Escola Estadual Dom Gino Malvestio. Então é necessário que tenha mais escolas. Em relação à saúde, a população aqui do bairro vai buscar atendimento também em outras áreas da cidade, pois os postos daqui encaminham para essas outras áreas”, afirma.

Para João Lúcio, de 46 anos, morador do bairro desde 2002, a identidade do bairro é a Ponte Amazonino Mendes, que liga a localidade ao restante da cidade. Ele diz ainda que o bairro melhorou muito em questão de infraestrutura, porém ainda falta muita coisa.

O processo de fundação do bairro

Na década de 1990, o Brasil vivenciava o seu processo de urbanização influenciado pela industrialização do país, sendo assim, a população rural deu início a uma concentração em massa nos grandes centros urbanos. Em Parintins não foi diferente, pessoas de movimentos sociais, juntamente com homens públicos se aproveitaram de um pequeno grupo no início sem terreno, para fazerem invasões pela cidade de Parintins. Esse crescimento desordenado do município, fez com que ocorresse um dos maiores êxodos rurais da história da cidade, influenciado pela origem de três bairros na época. O (Itaúna I, o Itaúna II) e Paulo Corrêa. Sendo que anos depois parte da fazenda viria a ser invadida, transformando-se no Bairro União.

Alguns motivos desse processo de invasão são vários, como por exemplo: a falta de moradias, pessoas querendo tirar pedaços de terras para em seguida venderem, gente que vinha da zona rural para tentar novos rumos para as suas vidas. Em entrevista ao professor Gilciandro, responsável pela pesquisa, o senhor Emanuel apresenta argumentos sobre a origem do processo.

“O motivo é que as famílias tinham necessidade de ter uma moradia digna e nós no dia 24 de Abril de 1997, fizemos uma reunião com 300 famílias e invadimos a terra do Paulo Corrêa. Olha para nós invadirmos a fazenda Itaúna, vieram pessoas do interior, aqui próprio da cidade pra morar, e nós resolvemos tomar uma decisão de invadir a terra da fazenda do Itaúna, para que tivéssemos um pedaço de chão pra morar”, explica.

Naquela época as notícias através da imprensa local e por parentes disseminaram rapidamente, e famílias oriundas da zona rural e de diversas localidades do município, deslocaram-se até a cidade, na tentativa de também conseguirem um pedaço de terra. Além disso, existiam aquelas que se infiltravam no meio dos invasores para retirar lotes de terras e depois venderem, como relatou em entrevista o senhor Moisés Franco.

“Muitas pessoas vieram do interior, procurando melhorias aqui na cidade, outras vieram daqui mesmo. Às vezes alguns já tinham residências fixas, mas, com a invasão aproveitaram pra ganhar seu dinheiro, onde compravam mais barato e, depois vendiam com preço mais alto, pra adquirirem dinheiro”, relembra.

Assim iniciou o processo de invasão do bairro, onde as famílias começaram ocupando a área do lado direito da Avenida Geny Bentes, que daria mais tarde origem ao bairro de Paulo Corrêa. Porém ao tentarem permanecer na área da Fazenda Itaúna, houve a intervenção através de um mandado judicial, assinado pela Dra. Denilza Bezerra, juíza de direito, da época, referente à carta precatória oriunda da Comarca de Santarém, município do estado do Pará. Mandado que seria cumprido pelos oficiais de justiça da cidade de Parintins e por alguns policiais militares, com o objetivo de reintegração de posse da fazenda, impetrada pelo seu antigo dono. Assim a juíza de direito da época, determinou que todas as famílias fossem removidas e obrigadas a abandonarem a área atingida pela grande invasão. Fato que só agravava a tensão existente, mas que viria a ocorrer, forçando a condução das pessoas para o Ginásio de Esporte Elias Assayag, onde pernoitaram, sendo liberadas no dia seguinte.

Os confrontos com a polícia

Segundo o morador José Ziraldo, mesmo com a decisão da Justiça, alguns moradores permaneceram no local e enfrentaram as forças policiais. “Os tratores da empresa Carbrás, entraram na área invadida, demolindo barracos e abrigos. Só permaneceram na área, os mais corajosos que enfrentaram por vários dias as intervenções da polícia. Com persistência e determinação de nós e com a solidariedade e apoio da Igreja Católica, tendo como seu representante o Bispo Dom Gino Malvestio e com o incentivo do vereador da época, Everaldo Batista, outras famílias invadiram o local”, relata.

O relato de José é confirmado por outro morador que acompanhou a situação, o senhor Emanuel “Gaia”. “Um dos principais problemas que nós enfrentamos aqui no início do bairro foi contra o dono da terra, que ele queria tomar a terra na marra de nós, mesmo assim nós não desistimos, a polícia veio, nós enfrentamos a polícia e eu como representante do bairro anterior, eu fui chamado por mais de 50 vezes pela justiça, pela delegacia de polícia de Parintins, graças a Deus nada ocorreu comigo”, destaca.

A aliança com os políticos

Com um discurso de que queriam ajudar as pessoas, políticos da época instalaram um serviço de alto-falante na Avenida Geny Bentes, para dar apoio e incentivar as famílias a permanecerem no local. Assim aos poucos os invasores foram controlando a ação da Justiça, sensibilizando a sociedade e o poder público da época que se envolveu com a causa social, relatadas pelo senhor Emanuel “Gaia”. “Uma dessas reuniões, realizada em uma sessão ao ar livre na Avenida Geny Bentes com o plenário montado em cima de caminhões, onde estavam presentes o presidente da Câmara, o vereador Frank Luis Cunha Garcia, os vereadores José Walmir de Lima, Valdete Pimentel, Osório Melo Neto, Iranildo Azedo, José Milagres e vice-prefeito, Dr. Osvaldo José Pessoa Ferreira, oficializaram os bairros denominando-os de Bairros da União I e II. Só que nós moradores não aprovamos os nomes dado”, conta.

A escolha definitiva do nome

Com todos esses impasses a área urbana crescia sem planejamento e organização. Assim o representante da invasão, convocou uma assembleia extraordinária para definir os nomes dos bairros no dia 20 de abril de 1997. Fato que ocorreria no barracão da catequese, às 16:00h, com a presença de mais de 50% dos moradores que aprovaram os nomes: bairro de Itaúna II e Paulo Corrêa.De acordo com o senhor Moisés “o nome Paulo Corrêa foi escolhido na tentativa de sensibilizar o dono da área invadida para que o mesmo doasse as terras para os invasores. Fato que não viria a ocorrer por parte do dono da fazenda”. 

O início sem o básico

Esse processo de invasão que deu origem ao bairro foi bastante precário, pois os invasores não tinham o mínimo de infraestrutura, muitas vezes recebiam ajuda de voluntários, até para demarcar suas terras, pois não conheciam e não tinham técnica para tal trabalho, sendo relatadas pelo senhor, Moisés. “É, no início aqui não tinham ruas, era apenas mato, só tinham caminhos, no lugar das ruas. Assim tivemos pessoas que foram chegando por aqui como eu. O senhor Jessé também que eu vou citar aqui, que ajudou muito no começo dessa invasão desse bairro e foi uma luta né, fazíamos aqueles caminhos abrindo com terçado, com machado derrubando as árvores, pra fazer as ruas pra depois passar. Assim montamos uma comissão e dividimos, 10 metros de terra para cada morador que hoje existe aqui no bairro. Resolvemos falar com um rapaz (Belém) que podia nos ajudar, ai ele demarcou as ruas todinhas e foi localizando, moradores de casa em casa, terreno em terreno para que pudéssemos fazer à organização do bairro”, relembra.

Trecho do bairro Paulo Corrêa atualmente - Foto: Jornalismo Parintins

No início do processo de invasão, algumas famílias moravam debaixo dos barracos improvisados com lonas, papelões redes, sacos plásticos, palhas de inajá e varas retiradas da própria vegetação do local e não tinham água adequada e iluminação pública. Como destaca um dos líderes do movimento de invasão, senhor Emanuel “Gaia”. “Outra coisa que também nós não iniciamos aqui foi com água encanada, e mandamos puxá-la de cacimbas e de algumas torneiras que tinham proximidades com a localidade pra fazermos a nossa alimentação. Logo após chegar à água, nós compramos 50 postes. Cada morador dava R$ 5,00 e para que a gente pudesse comprar os 50 postes para puxar a luz aqui paro o bairro”, relata.

A compra definitiva dos terrenos

Assim a legalidade dos terrenos viria com a compra das terras da fazenda no ano de 2002, quando o empresário Paulo Corrêa entrou mais uma vez, com outro pedido de reintegração de posse. Assim sendo após mobilização de parte da sociedade, como do prefeito da época, Enéas Gonçalves, do Bispo D. Giuliano Frigeni e a Dra. Sinatra Santos, advogada do município, foram até a cidade de Santarém na tentativa de fazerem um acerto sobre a área invadida de propriedade do empresário.

Esse processo de venda e compra das terras do bairro, ocorreu sobre o artigo 66 da Lei Orgânica do Município de Parintins, sendo o valor pago de 400 mil reais ao antigo proprietário. Assim a Prefeitura comprou do proprietário as terras invadidas, fazendo doações no mesmo ano aos moradores do bairro. Para tanto foi necessário todo um trâmite legal, através do Setor de Terras e Cadastro que cedeu o título definitivo aos interessados, pela lei municipal nº 09180 de 20/11/80 e com o regulamento de Terras Patrimoniais em vigor, do dia 18 de setembro de 2002.

A passos bem lentos o bairro foi sendo estruturado com a urbanização, onde as obras de infraestrutura vieram anos depois de muitas lutas e reivindicações por parte da associação e dos moradores, como: pavimentação asfáltica de algumas ruas, calçadas, além dos serviços de água encanada, energia elétrica e da construção de instituições públicas de ensino e saúde, fazendo com que a localidade ganhe cada vez mais ares urbanos. Porém, é válido lembrar que não é o suficiente, ainda, muitas melhorias precisam ser feitas pelo poder público no bairro, principalmente, no setor educacional e de saúde, dando mais suporte e estrutura para o melhoramento da funcionalidade de ambos.

 

Por: Vinícius Bellchior Bruce e Ana Cristina Ferreira Machado – ambos graduados em Comunicação Social – Jornalismo, pela Universidade Federal do Amazonas – Campus Parintins.

Vinícius Bellchior - Equipe Jornalismo Parintins

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