"Tirar animais silvestres da vida na floresta pode causar sérios danos à saúde humana" - Entrevista com Joel Araújo, superintendente do Ibama no Amazonas

Em entrevista exclusiva ao Jornalismo Parintins, o superintendente comenta o novo momento do órgão ambiental, as metas da sua gestão, os desafios de 15 anos de trabalho no Ibama como analista ambiental, e a polêmica envolvendo o Ibama e o influenciador amazonense, Agenor Tupinambá

24/04/2023 às 10h06 Atualizada em 21/08/2023 às 19h23
Por: Redação
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Parintinense Joel Araújo - Foto: Arquivo pessoal
Parintinense Joel Araújo - Foto: Arquivo pessoal

Joel Araújo, parintinense, analista ambiental e servidor de carreira do Ibama, foi nomeado no dia 16 de janeiro como superintendente substituto do Ibama no Amazonas, pela ministra do Meio Ambiente do governo Lula, Marina Silva.

Em entrevista exclusiva ao Jornalismo Parintins, o superintendente comenta o novo momento do órgão ambiental, as metas da sua gestão, os desafios de 15 anos de trabalho no Ibama como analista ambiental, e a polêmica envolvendo o Ibama e o influenciador amazonense, Agenor Tupinambá.

Joel possui graduação em Licenciatura Plena em Geografia pela Universidade do Estado do Amazonas (2005). É Especialista em Gestão Ambiental pela Faculdade da Serra (FASE). É Mestrando no Mestrado Profissional em Gestão de Áreas Protegidas (MP-GAP) no Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (INPA). Tem experiência na área de Geografia e Gestão Ambiental, com ênfase em Meio Ambiente e Recursos Naturais, atuando principalmente nos seguintes temas: educação ambiental, legislação ambiental, gestão ambiental, unidades de conservação, Parintins e resíduos sólidos.

Foto: Arquivo pessoal

Confira a entrevista:

Jornalismo Parintins: Quais são as pautas prioritárias da gestão do Ibama neste ano de 2023?

Joel Araújo: As nossas pautas prioritárias no ano de 2023 é a reconstrução do Ibama. A gente precisa melhorar o prédio, a quantidade de servidores, e reorganizar a atuação do Ibama na pauta técnica ambiental, tanto a questão da educação ambiental, a inteligência ambiental, as atividades dos projetos do Ibama, como o projeto “Quelônios na Amazônia”, o “Manejo de Pirarucu” e a fiscalização ambiental que está sendo reorganizada, o Ibama já está funcionando bem. Também temos como pauta a integração com outros órgãos para criar uma gestão ambiental integrada no estado do Amazonas.

Jornalismo Parintins: Há quase 4 meses à frente do órgão, o que de mais importante já foi realizado na sua gestão?

Joel Araújo: Eu considero que nós tivemos várias vitórias. Nós conseguimos reorganizar os contratos de licitação do órgão, de fornecimento de água, fornecimento de remédios, fornecimento de alimentos para os animais dos Centros de Triagem de Animais Silvestres (Cetas), a manutenção predial, vários processos de licitação administrativa foram reorganizados, mas também já temos um planejamento básico para o ano todo. Tem projetos para o Ibama, do ponto de vista administrativo o principal deles é a reforma do prédio, e do ponto de vista técnico ambiental é a queda dos números do desmatamento no estado do Amazonas.

Jornalismo Parintins: Você esteve recentemente (no dia 5 de março) com a ministra Marina Silva, em Manaus, qual foi a principal pauta tratada com a líder da pasta do Meio Ambiente do governo Lula?

Joel Araújo: Eu estive em duas oportunidades com a ministra Marina Silva. Ela esteve no Amazonas de passagem, e a gente foi fazer a segurança dela e escoltar as suas atividades. Tivemos então a oportunidade de conversar rapidamente com os servidores do Ibama. E a segunda vez foi quando ela esteve na visita as áreas onde houve desmoronamento de terras e as chuvas arrastaram casas; então a gente a acompanhou na sua agenda em Manaus e ali a gente pôde conversar um pouco mais da importância da vinda dela a Manaus para valorizar a região amazônica, valorizar a nossa cidade na pauta ambiental, na pautas das mudanças climáticas, e aí também falamos um pouco do nosso trabalho de como está o Ibama no estado do Amazonas, as nossas condições, as condições do prédio, e as condições técnicas em questão de números de servidores, explicamos para ela o atual cenário e ela muito educada, muito carinhosa, muito atenciosa com os servidores. Ela ouviu atentamente e disse que procuraria melhorias para o Ibama no Amazonas.

Também estive com o presidente do Ibama, Rodrigo Agostinho. Na primeira oportunidade de conversar, a gente visitou a cidade de Atalaia do Norte, no Rio Javari, e lá nós participamos de um evento do Ministério dos Povos Indígenas, com a presença da líder da pasta, Sônia Guajajara, com a presença da presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana e outras lideranças nacionais. Estavam presentes também o diretor nacional da Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) e o diretor nacional de Segurança Pública do Governo Federal. Então a gente pôde conversar bastante, expliquei a ele a situação do Amazonas, falei com ele a respeito da nomeação dos superintendentes, da importância de nomear servidores do Ibama no Brasil inteiro, porque a gente tem essa preocupação de nomear servidores para os cargos de diretoria, de coordenação e superintendências, e depois eu participei da posse dele em Brasília, foi bem legal. No discurso de posse ele citou o meu nome como referência de servidor dedicado a todos os servidores do Ibama.

Jornalismo Parintins: No mês de março, em entrevista, você disse que o Estado passaria por uma revolução ambiental, o que seria essa revolução?

Joel Araújo: Eu me referi a gestão do Ibama, que o órgão voltaria a funcionar, que nós passaríamos por uma reconstrução, uma renovação, na gestão administrativa das finanças e na gestão técnica ambiental, que nós derrubaríamos o desmatamento, o garimpo ilegal no estado do Amazonas, e o Ibama voltaria a funcionar no combate à biopirataria, nos crimes contra a fauna, nos crimes contra as terras indígenas, as unidades de conservação federais, então haveria uma revolução no funcionamento do Ibama.

Uma proposta que nós temos até hoje é de realizar uma gestão ambiental integrada com a Secretaria de Estado do Meio Ambiente (Sema), com o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (IPAAM), com o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), Polícia Federal, Funai, Ministério Público Federal, secretarias municipais de meio ambiente e tantos outros órgãos que trabalham na pauta ambiental - o que seria uma grande revolução ambiental no Estado.

Jornalismo Parintins: Durante todo esse tempo de carreira, o que mais marcou você nas operações ambientais?

Joel Araújo: Eu tenho 15 anos de Ibama e já passei por bastante situações impressionantes da beleza amazônica, da natureza da Amazônia, do nosso pôr do sol, do nosso céu, da nossa fauna, da nossa floresta, dos nossos rios. É muito bom ver de perto e também é muito triste ver a floresta derrubada, queimada, áreas gigantescas que poderiam servir de abrigo para toda uma diversidade de fauna, de flora, de insetos e toda espécie de vida e é destruída pela ambição do homem, mas também foram muitos desafios, como o enfretamento a infratores, garimpeiros, desmatadores, exploradores ilegais de comerciantes de madeira, pescadores ilegais, foram muitos desafios.

Foto: Arquivo pessoal

Fizemos muita gestão de conflitos, conflitos graves inclusive, mas também tive a oportunidade de conhecer muitos servidores dedicados, como os colegas que trabalham em Brasília, é incrível o trabalho deles, é muito técnico, muita dedicação, muito amor pelo trabalho e pela causa. E nos estados também, cada estado tem uma liderança importante, pessoas com bastante idade e jovens muito obstinados, pessoas muito inteligentes e educadas. Eu poderia dizer que eu conheço muitos servidores do Ibama que trabalham na Amazônia Legal, todos os superintendentes, muitos do Nordeste, então acho que essa capilaridade nossa, essa capacidade de articulação, esse conhecimento que nós temos com os colegas, as amizades que foram construídas, demonstram que o Ibama é recheado de grandes técnicos, de pessoas muito capacitadas e dedicadas a causa.

Jornalismo Parintins: Quais são as principais denúncias que o Ibama recebe aqui no Amazonas?

Joel Araújo: As denúncias são principalmente de exploração ilegal de madeira. Muitas denúncias que o Ibama recebe dizem respeito as competências do Estado. Então essas denúncias são repassadas ao Ipaam, somente denúncias de infrações ambientais de maior impacto em terras indígenas, em áreas federais, de garimpo, áreas de fronteira, rio interestaduais, aquelas denúncias que são realmente da competência do Ibama é que a gente absorve para atender as demandas, ou aquilo que o Ministério Público Federal determina que nós façamos. Nós temos um planejamento anual, um trabalho de inteligência, temos a Agência Brasileira de Inteligência (Abin), temos uma inteligência interna do Ibama também, que faz um estudo das prioridades que o Ibama deve atender, e aí com base nesses estudos a gente planeja as nossas ações.

Jornalismo Parintins: E a principal dificuldade que o Ibama enfrenta em relação a operações aqui no Estado?

Joel Araújo: Um órgão que se propõe a proteger um estado do tamanho do Amazonas precisa de mais capilaridade, precisa de mais unidades funcionando no interior do estado, por exemplo: Tabatinga, Parintins, Humaitá e Boca do Acre, eu entendo que são cidades onde a presença do Ibama é fundamental, e para isso tem que ser um Ibama forte, um Ibama grande, equipado, com servidores, com aparato técnico-tecnológico, para poder executar o seu trabalho da melhor forma. Então a gente precisa de uma inteligência mais apurada. Eu acredito que no estado do Amazonas nós precisamos de uma embarcação ferry boat, e isso é um valor muito alto, infelizmente a manutenção é muito cara, ainda não houve interesse do Governo Federal de adquirir um bem dessa estatura, mas que resolveria uma série de problemas que nós temos em relação a deslocamento no estado do Amazonas.

Jornalismo Parintins: Está em alta a discussão sobre a multa aplicada pelo Ibama ao influenciador amazonense Agenor Tupinambá, pessoas contra e a favor estão repercutindo o assunto, tanto no âmbito local e nacional, você como analista ambiental e superintendente substituto do Ibama no Amazonas, o que você tem a dizer a população sobre o assunto?

Joel Araújo: O que nós queremos transmitir é que não se trata apenas de apenas um animal, não se trata de uma capivara, mas se trata do abuso da exploração da imagem do cativeiro ilegal e do maus tratos a uma série de animais silvestres, como o papagaio, duas preguiças – inclusive uma que teria morrido no poder de Agenor, uma arara, uma jiboia, uma coruja, uma série de animais da fauna que ele exibe nas suas redes sociais, e além de manusear ovos de jacarés e uma série de outras ações que configuram infração ambiental. Então a gente não quer fazer a discussão da capivara, mas sim a discussão do abuso e da exploração da imagem de animais silvestres em situação de maus-tratos.

Outra mensagem que queremos é que não se pode tirar animais da fauna silvestre para tratá-los como pet, não se pode tirar um animal que vive na floresta para domesticá-lo ou para morar numa residência, lugar de animal é na vida silvestre, é em liberdade, numa vida livre de verdade. Tirar animais silvestres da vida na floresta pode causar sérios danos à saúde humana, inclusive pandemias como foi o caso da Covid-19, que matou só no Brasil 700 mil pessoas. Então além de proteger a fauna, o Ibama também protege a saúde humana, protege a vida humana, a vida da sociedade.

Quando o Ibama combate um garimpeiro, também previne a mortandade de pessoas e o adoecimento. Quando o Ibama combate o desmatamento, previne a emissão de gases, poluição, o que pode causar doenças respiratórias, então o Ibama também salva vidas. Nós prevenimos a transmissão de doenças por animais vetores e ao mesmo tempo protegemos a fauna, que é a nossa obrigação.

Jornalismo Parintins: Olhando para atrás no início da sua carreira, você imaginava que você chegaria a um cargo tão importante dentro do Ibama?

Joel Araújo: Confesso que eu não imaginava chegar ao cargo de superintendente. Era muito difícil no começo, eu era recém-contratado, trabalhei muito... Mas tinha muitas pessoas altamente competentes no Estado, muitas pessoas com muito mais experiência, pessoas com experiência de Manaus. Eu fui lotado por mais de 10 anos na unidade técnica de Parintins, então a minha experiência era uma, enquanto outros colegas tiveram a experiência de Manaus, de capital, de superintendências. Hoje eu consegui ter essa experiência de superintendência. Obviamente após 15 anos de trabalho, os colegas em Brasília visualizaram o nosso trabalho como um trabalho com potencial para a superintendência, e aí decidiram fazer a indicação. Essa indicação foi técnica.

Se você me perguntasse isso há 3 anos, eu diria que eu não imaginava alcançar esse cargo. Sofremos muitas perseguições nos últimos 4 anos, eu mesmo tive que sair da minha lotação inicial – que era em Parintins - e tive que ir para Manaus, e isso foi muito ruim pra mim e pra minha família, mas tive que levantar a cabeça e trabalhar bastante, e fazer a resistência contra os desmandos do governo federal passado dentro do Ibama, através da associação dos servidores. Já fui presidente e hoje sou vice-presidente da Associação de Servidores da Carreira de Especialistas em Meio Ambiente do Ibama. Então com muita luta, com muita resistência, muita militância interna, a gente conseguiu sobreviver, apesar das ameaças, apesar dos abusos administrativos contra os servidores a gente conseguiu sobreviver, com muita coragem e resiliência. E aí com essa mudança de governo, a gente pôde se colocar à disposição do órgão para poder fazer a gestão no Ibama aqui no Amazonas.

 

Por: Vinícius Bellchior Bruce e Ana Cristina Ferreira Machado – ambos acadêmicos do curso de Comunicação Social – Jornalismo, da Universidade Federal do Amazonas – Campus Parintins.

Vinícius Bellchior - Equipe Jornalismo Parintins

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