A arte da dupla de parintinenses Alzzyney Pereira e Kemerson Freitas, denominada “Curumiz”, teve origem na Universidade Federal do Amazonas – campus Parintins, estampou alguns locais da cidade e agora se faz presente na identidade visual do Festival Folclórico de Parintins 2023, que acontece no final de junho. Em entrevista ao Jornalismo Parintins, os artistas visuais comentam sobre a origem da dupla, o conceito e a repercussão dos seus trabalhos, investimento em cultura e as perspectivas em relação ao futuro dos “Curumiz”.
Confira a entrevista:
Jornalismo Parintins: Fale-nos um pouco mais do início da trajetória de vocês, da fase inicial dos "Curumiz", da ideia a consolidação da dupla.
Kemerson Freitas: O projeto “Curumiz” começou na UFAM Parintins, em 2017. Começamos a pintar e a partir daí a gente começou a fazer exposições. Em 2019 tivemos a nossa primeira exposição, na qual a gente se consolidou como artistas no Amazonas.
Jornalismo Parintins: Vocês imaginaram que algum dia produziriam a identidade visual do Festival Folclórico de Parintins? Considerado o maior espetáculo ao céu aberto do planeta?
Identidade visual do Festival Folclórico de Parintins 2023 - Imagem: Divulgação
Alzzyney Pereira: A gente sempre almeja coisas boas e novas que a gente já acompanha em outros artistas também de referência, como ter exposição fora, viajar para outros países e para outros estados, levando a cultura por meio do grafite. Para o Festival de Parintins, a gente não imaginava, imaginávamos apenas pintar a fachada do Bumbódromo, mas a marca do festival foi um acréscimo e repercutiu bastante, tanto que a Secretaria de Cultura gostou da ideia de unir essas duas artes para o festival deste ano. Falar de festival é falar de arte e de cultura, então isso só agregou com festival e com a gente também.
Mural Vitória da Cultural Popular, no Bumbódromo - Foto: Michael Dantas
Jornalismo Parintins: Vocês também produziram uma arte para a última Bienal da UNE (União Nacional dos Estudantes) que ocorreu no início de fevereiro, no Rio de Janeiro. Como a arte dos “Curumiz” chegou ao maior evento estudantil da América Latina?
Arte produzida para a Bienal da UNE - Imagem: Reprodução/Instagram
Kemerson Freitas: Como também a gente utiliza as redes sociais, as pessoas nos seguem, e uma dessas pessoas é a Bruna Brelaz, presidente da UNE. Ela gostou muito do nosso trabalho, principalmente do mural do festival, então a partir disso a gente foi convidado para fazer um dos cartazes da UNE. Foi muito satisfatório porque é um evento importantíssimo para os estudantes, eu sou formado pela UFAM e o Alzzyney continua estudando. Então para mim, ter o nosso trabalho nesse movimento estudantil é fundamental, porque o nosso trabalho cresceu e se desenvolveu no âmbito estudantil.
Jornalismo Parintins: Vocês acreditam que produzir o mural do Bumbódromo, intitulado Mural “Vitória da Cultura Popular”, foi a porta de entrada para os “Curumiz” alçarem voos maiores?
Alzzyney Pereira: A produção do mural foi uma das portas. Todo o artista grafiteiro e muralista ele almeja pintar uma fachada – uma empena, como é conhecida a pintura de mural. A gente ter pintado um mural em nossa cidade que fala sobre a nossa cultura foi um acréscimo para a gente. Foi uma porta que todo artista quer abrir, que é pintar um prédio e uma fachada enorme para deixar um trabalho gigante para todo mundo ver e tirar foto. O que abre portas também é a continuidade do trabalho. A gente sempre produziu bastante, estamos sempre atentos aos editais, aos eventos de graffiti, para sairmos de Parintins e levar a cultura daqui para outros lugares e para outras pessoas absorverem o nosso trabalho, e isso demonstra que ainda tem muito a se conquistar. A gente continuar pintando e mostrando a nossa cultura para fora do Amazonas sempre vai abrir outras portas.
Jornalismo Parintins: Parintins é terra de arte e de artistas naturais, vocês acreditam que a cidade necessita de mais investimentos em seus artistas e em consequência, na sua própria cultura?
Arte dos "Curumiz", em Manaus - Imagem: Reprodução/Instagram
Kemerson Freitas: Sim, com certeza. A cidade de Parintins necessita de espaços no qual consiga fomentar a cultura parintinense, como por exemplo, projetos culturais, exposições, como galerias principalmente. Parintins necessita disso por ter uma gama de artistas e os trabalhos não são fomentados, tanto na área visual, teatral e musical. Como jovens, a gente tem essa necessidade de ter um espaço no qual o nosso trabalho seja reconhecido. Hoje na cidade de Parintins, a gente ver que ainda não pensam nisso. Eu e o Alzzyney viajamos para outros locais que tem esse fomento cultural no trabalho artístico dos jovens e em Parintins não tem, isso é uma carência enorme.
Jornalismo Parintins: Recentemente, os “Curumiz” assinaram uma arte no Banco Santander, em Parintins, como foi o contato desse grande banco com a arte de vocês?
Fachada do Banco Santander, em Parintins - Imagem: Reprodução/Instagram
Alzzyney Pereira: O contato do banco com a gente surgiu da ideia que eles têm de valorizar a cultura de certas cidades, e como Parintins é rica em cultura por meio do festival, eles chegaram até nós por e-mail com uma solicitação com essa proposta de trabalho, de fazer um grafite que contasse um pouco da cultura da cidade. Em todo o Brasil eles fazem isso com os artistas de rua e grafiteiros, então há esse projeto do banco de transformar as suas agências em arte. Foi um trabalho muito legal porque a gente fala do festival de uma maneira bem nossa e não deixando de lado os confrontos que os patrocinadores tem, porque não é um banco que patrocina o festival, mas ele busca valorizar a cultura local.
Jornalismo Parintins: Existem artistas nos quais vocês se inspiram?
Kemerson Freitas: Sim. Os artistas que a gente se inspira são mais da arte urbana, como Os Gêmeos, Eduardo Kobra, os muralistas mexicanos e os clássicos também, como Salvador Dalí. Então esses artistas nos inspiraram a desenvolver o nosso trabalho.
Jornalismo Parintins: O que a arte dos “Curumiz” sempre tem a dizer? Depende do trabalho?
Obra "Cunhata", que mostra a cultura ribeirinha por meio da imagem de uma menina com a cúpula do Teatro Amazonas sobre a cabeça - Imagem: Reprodução/Instagram
Kemerson Freitas: O nosso trabalho pensa muito num meio de descolonizar o pensamento sobre falas amazônicas. A gente queria quebrar esse paradigma de produção artística em Parintins, aquela coisa de copiar o realismo de uma foto e falar de uma forma muito prosaica – muito natural da Amazônia, e aí a gente pensou numa Amazônia diferente, de abordá-la de uma forma mais contemporânea. É um modo de visão talvez cosmológica sobre o que é a Amazônia. Então a gente parte dessa brincadeira de cosmologia, de um modo de visão do indígena e também do ribeirinho. Então, por exemplo, esse hibridismo de formas humanas com animais não surgiu do nada, ela está presente na nossa cultura, pincipalmente na dos povos tradicionais. Então a gente parte dessa visão do mundo como a Amazônia também é um espaço imaginativo e queríamos falar de um jeito próprio da Amazônia, pincipalmente como pessoas que vivem dentro da Amazônia.
Arte dos "Curumiz" - Imagem: Reprodução/Instagram
Jornalismo Parintins: Fale-nos um pouco mais sobre o projeto “Arte Ribeira” dos “Curumiz”.
Arte ribeirinha dos "Curumiz" - Imagem: Reprodução/Instagram
Alzzyney Pereira: Foi um projeto muito legal apoiado pela Lei Aldir Blanc, nós espalhamos um pouco de arte por meio do graffiti pelas comunidades circunvizinhas de Parintins, como Vila Amazônia, Bom Socorro do Zé Açú e Ilha das Guaribas. Tudo isso contribuiu um pouco com os moradores e para a gente também, pois foi a nossa primeira experiência de viajar para comunidades ribeirinhas e deixar uma mensagem e uma arte na casa das pessoas e ser bem acolhido. Foi uma sensação muito boa realizar esses trabalhos porque a gente viu que a dificuldade era nítida nas comunidades que a gente visitou. Era alagado ou não tinha tanta infraestrutura.
Jornalismo Parintins: Vocês também produziram o maior mural em graffiti do Baixo Amazonas, em Parintins, qual a mensagem da arte presente no mural?
Obra "Aquário Amazônico" - Imagem: Divulgação
Alzzyney Pereira: O nome do mural é Aquário Amazônico. A gente quis repassar a mensagem da abundância que o Rio Amazonas nos dá, que é o peixe, a água e também abordar a nossa biodiversidade, que é o rio e a floresta. A gente meio que mesclou vários animais e pessoas. Levamos a mensagem de falar sobre os animais e abundância que tem o Rio Amazonas - a nossa engrenagem maior - principalmente para os ribeirinhos, de onde vem alguns alimentos que abastece o município.
Jornalismo Parintins: A arte dos “Curumiz” saiu de Parintins e já rompe as barreiras do Estado, vocês possuem contato com artistas de fora do Brasil?
Obra "Tucumanzeiro" sendo exibida em Belém, no Pará - Imagem: Reprodução/Instagram
Kemerson Freitas: Hoje a gente tem um networking com outros artistas de fora do Estado, e até importante também aprender com eles e podemos até repassar para os jovens de Parintins.
Jornalismo Parintins: Olhando para atrás, vocês imaginaram que chegariam tão longe e quais são as perspectivas dos “Curumiz” para o futuro?
Obra "Vagante Arara" - Imagem: Reprodução/Instagram
Alzzyney Pereira: A gente imaginava alcançar várias coisas, e acredito que estamos na metade daquilo que a gente pensa em chegar, como expor fora do Brasil, pintar mural fora do Estado, participar de eventos de grafite, levar oficinas de graffiti para as comunidades, não só de Parintins mas de outras localidades, participar de várias coisas e levar a arte ribeirinha de Parintins para outros lugares. Acho que ainda falta muita coisa para acontecer, a gente está sempre trabalhando para que isso aconteça, e é isso que a gente espera do futuro. Acredito que a arte traz a mensagem não só de beleza mas de contar uma história, uma narrativa, falar um pouco da cultura, principalmente da nossa.
Por: Vinícius Bellchior Bruce e Ana Cristina Ferreira Machado – ambos acadêmicos do curso de Comunicação Social – Jornalismo, da Universidade Federal do Amazonas – Campus Parintins.
Vinícius Bellchior - Equipe Jornalismo Parintins
Ana Cristina Machado - Equipe Jornalismo Parintins
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